Houve uma época de grande estiagem aqui pras nossas bandas, não lembro ao certo em que ano, só sei que foi na década de 1960. As lavouras começavam a sentir a longa estiagem.
Naquela época o agricultor não tinha a quem recorrer para sair dessas situações desesperadoras como a perda da produção, não tinha os chamados programas de governo (Proagro ou similar), o jeito era apelar para as orações, na esperança de que chovesse a tempo de salvar as plantações, e isso, se fazia através de novenas.
Essas novenas eram rezadas em todos os sítios e em todas as casas, onde o santo ou a santa invocada tinha a imagem transportada pelos fiéis da comunidade, em procissões. Neste caso, se não me engano, era Santa Clara.
Em cada casa que se rezava o terço, era costume servir café com bolinhos de chuva e quitutes caseiros de toda ordem, era na verdade, para as crianças, uma verdadeira festa. Estávamos em todas.
Entre os adultos fiéis sempre tem alguma carola metida a besta que implica com tudo e com todos, principalmente com as crianças, se achando a dona da verdade e ungida pela santa. Nessa, não era diferente, tinha a tal de D. Gina, mulher roliça, de meia idade, sempre puxava a procissão, e graças a essas qualidades, ela conseguiu angariar a antipatia do grupo de meninos, e também dos marmanjos, pois implicava com os namoricos furtivos da rapaziada.
Certo dia, o Chico meu irmão teve uma idéia (daquela cabeça sempre saía alguma coisa). Reuniu a turma e explicou:
— Então pessoal! Que tal sacanear essa véia chata?
— Só se for agora. Qual é o plano? Perguntou o Adé.
— É o seguinte: como ela é muito pra frente, amanhã, durante o terço na casa do Bereta, nós saímos escondidos, vamos até a porteira, passamos merda na tranca e voltamos como se nada tivesse acontecido, quando a procissão prosseguir e ela for abrir a porteira, vai ser uma meleca só.
— Ótima idéia, respondeu o Adé, só que temos que passar nas tábuas da porteira também, pra não ter escapatória, principalmente para aqueles moleques que vão na frente e passam entre elas.
— Combinado então. E vocês molecada, bico calado, ninguém pode saber disso, falou se dirigindo a nós crianças.
E assim foi feito. Durante o terço, todos concentrados na reza, um por um foi escapando de fininho e de repente, todos estavam reunidos na porteira, não se sabe como, mas munidos da matéria-prima necessária para conclusão da obra.
Tudo saiu direitinho, dentro do combinado. Aos poucos, foram voltando um a um sorrateiramente para ninguém perceber nada. Enquanto isso, o terço continuava e todos já de volta, ali com a cara mais santa do mundo como se nada tivesse acontecido.
Terminada a reza, foram servido a todos o tradicional cafezinho e a prosa rolou solta, todo mundo contando as novidades, dentro da maior normalidade do mundo. Os rezadores se despediram do dono da casa e a procissão seguiu viagem, nós acompanhamos como normalmente fazíamos, para não levantar suspeitas, entoando cantos e rezas como de costume, pois, apesar das molecagens, éramos fervorosos fiéis.
Quando a procissão chegou à porteira foi aquela confusão. Dona Gina, pra frente como só ela mesma, meteu a mão na meleca e gritou.
— Quem foi o desgraçado do moleque que passou merda na tranca? Filho da outra... daquela outra... e foi desfiando um rosário de impropérios. Enquanto isso, os moleques mais adiantadinhos também foram passar entre as tábuas e se melaram todos.
Aí sim é que a coisa pegou fogo, foi aquele alvoroço, todo mundo xingando todo mundo e querendo saber quem foram os malditos que fizeram tamanha barbaridade, que aquilo era uma afronta a Santa, que eles iriam para o inferno, que ia acontecer isso, aquilo... enfim, todo tipo de pragas e maldições foram lançadas sobre nossas cabeças.
A confusão foi tanta e disseram tantos impropérios que todas as orações feitas antes, devem ter idas por água abaixo. Enquanto isso, nós nos divertíamos vendo a megera ser motivo de chacota de toda a turma, indo embora de cabeça baixa para casa se livrar do forte odor que impregnava até a alma.
A nossa vingança foi terrível. Vingamos as maldades que ela cometia contra nós crianças e ainda livramos o grupo de sua indesejável presença na novena, pois, a partir desse dia, ela nunca mais apareceu nos terços.
Naquela época o agricultor não tinha a quem recorrer para sair dessas situações desesperadoras como a perda da produção, não tinha os chamados programas de governo (Proagro ou similar), o jeito era apelar para as orações, na esperança de que chovesse a tempo de salvar as plantações, e isso, se fazia através de novenas.
Essas novenas eram rezadas em todos os sítios e em todas as casas, onde o santo ou a santa invocada tinha a imagem transportada pelos fiéis da comunidade, em procissões. Neste caso, se não me engano, era Santa Clara.
Em cada casa que se rezava o terço, era costume servir café com bolinhos de chuva e quitutes caseiros de toda ordem, era na verdade, para as crianças, uma verdadeira festa. Estávamos em todas.
Entre os adultos fiéis sempre tem alguma carola metida a besta que implica com tudo e com todos, principalmente com as crianças, se achando a dona da verdade e ungida pela santa. Nessa, não era diferente, tinha a tal de D. Gina, mulher roliça, de meia idade, sempre puxava a procissão, e graças a essas qualidades, ela conseguiu angariar a antipatia do grupo de meninos, e também dos marmanjos, pois implicava com os namoricos furtivos da rapaziada.
Certo dia, o Chico meu irmão teve uma idéia (daquela cabeça sempre saía alguma coisa). Reuniu a turma e explicou:
— Então pessoal! Que tal sacanear essa véia chata?
— Só se for agora. Qual é o plano? Perguntou o Adé.
— É o seguinte: como ela é muito pra frente, amanhã, durante o terço na casa do Bereta, nós saímos escondidos, vamos até a porteira, passamos merda na tranca e voltamos como se nada tivesse acontecido, quando a procissão prosseguir e ela for abrir a porteira, vai ser uma meleca só.
— Ótima idéia, respondeu o Adé, só que temos que passar nas tábuas da porteira também, pra não ter escapatória, principalmente para aqueles moleques que vão na frente e passam entre elas.
— Combinado então. E vocês molecada, bico calado, ninguém pode saber disso, falou se dirigindo a nós crianças.
E assim foi feito. Durante o terço, todos concentrados na reza, um por um foi escapando de fininho e de repente, todos estavam reunidos na porteira, não se sabe como, mas munidos da matéria-prima necessária para conclusão da obra.
Tudo saiu direitinho, dentro do combinado. Aos poucos, foram voltando um a um sorrateiramente para ninguém perceber nada. Enquanto isso, o terço continuava e todos já de volta, ali com a cara mais santa do mundo como se nada tivesse acontecido.
Terminada a reza, foram servido a todos o tradicional cafezinho e a prosa rolou solta, todo mundo contando as novidades, dentro da maior normalidade do mundo. Os rezadores se despediram do dono da casa e a procissão seguiu viagem, nós acompanhamos como normalmente fazíamos, para não levantar suspeitas, entoando cantos e rezas como de costume, pois, apesar das molecagens, éramos fervorosos fiéis.
Quando a procissão chegou à porteira foi aquela confusão. Dona Gina, pra frente como só ela mesma, meteu a mão na meleca e gritou.
— Quem foi o desgraçado do moleque que passou merda na tranca? Filho da outra... daquela outra... e foi desfiando um rosário de impropérios. Enquanto isso, os moleques mais adiantadinhos também foram passar entre as tábuas e se melaram todos.
Aí sim é que a coisa pegou fogo, foi aquele alvoroço, todo mundo xingando todo mundo e querendo saber quem foram os malditos que fizeram tamanha barbaridade, que aquilo era uma afronta a Santa, que eles iriam para o inferno, que ia acontecer isso, aquilo... enfim, todo tipo de pragas e maldições foram lançadas sobre nossas cabeças.
A confusão foi tanta e disseram tantos impropérios que todas as orações feitas antes, devem ter idas por água abaixo. Enquanto isso, nós nos divertíamos vendo a megera ser motivo de chacota de toda a turma, indo embora de cabeça baixa para casa se livrar do forte odor que impregnava até a alma.
A nossa vingança foi terrível. Vingamos as maldades que ela cometia contra nós crianças e ainda livramos o grupo de sua indesejável presença na novena, pois, a partir desse dia, ela nunca mais apareceu nos terços.
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